terça-feira, 24 de novembro de 2009

A origem das espécies e o fim do mundo

no  Amálgama
por Otávio Dias – Hoje, neste 24 de novembro de 2009, comemora-se os 150 anos da publicação do trabalho seminal de Charles Darwin, Sobre a Origem das Espécies por Meio da Seleção Natural ou A Preservação de Raças Favorecidas na Luta pela Vida (tem uma versão online em inglês da obra aqui). O livro de Darwin toca em pontos ainda nevrálgicos da cultura humana, porque, ao discutir ciência, forneceu novas formas de enxergar o mundo e nossa existência que fugiam dos dogmas e paradigmas de qualquer doutrina religiosa.
Claro, resultou em briga, briga essa que já fora iniciada com Galilei e Newton – este último unificou, pela primeira vez e de forma indelével, explicações sobre fenômenos que ocorriam nos céus e no nosso mundano mundo – e de que Darwin não se esquivou ou comprou; seu livro foi muito influente pra época porque escrito para o público leigo, diferente da obra de Newton, por exemplo, que requeria certo refinamento matemático pra que fosse devidamente apreciada. Darwin fez com os seres vivos, como classe, o que Galilei e Newton fizeram com a Terra: tirou-nos de vez de nossa posição especial no Cosmos.
Há uma quantidade enorme de informações sobre Darwin espalhada pela internet e mesmo aqui no Amálgama e, a julgar pela qualidade dos comentários que surgem pra cada postagem, o assunto precisa ser continuamente exposto e debatido. Interessante que mesmo não tendo lido nada de Darwin, todos pretendem discutir sua obra e contradizer suas conclusões. Em geral, tropeçam nas ferramentas usadas por Darwin e tantos outros cientistas. “Não é à toa que chamam isso teoria,” insistem. Verdade, teoria, mas quantos por aí sabem o que é uma teoria científica? Que fique claro, é importante: a obra de Darwin nasce de observações feitas pelo inglês durante expedição pelo mundo, por experimentos e, como não podia deixar de ser no meio científico, pela troca de informações com outros estudiosos (falei rapidamente sobre essa troca em texto sobre o uso de outras mídias sociais).
Como uma teoria científica, as ideias de Darwin podem ser colocadas abaixo, em favor de outra teoria que se adeque melhor aos fatos: o progresso científico, diferente dos preceitos religiosos, envolve testes e discussões e, mais importante, quem pode dar a resposta final a uma questão é apenas a natureza ou, em outras palavras, os fatos. Por mais estranha que possa ser a natureza, é a teoria que deve se encaixar nela, e não o contrário; em outras palavras – só pra dar alguns exemplos –, se a Terra foi criada há 5 mil anos, não deveria ser possível encontrar fósseis de datas anteriores, e se não há evolução e adaptação através das gerações, então deveria haver fósseis de coelhos e homens com a mesma idade que os de dinossauros. As teorias científicas caem por terra e são substituídas por outras melhores; elas devem explicar a natureza, os fatos, diferente dos dogmas religiosos, que pretendem fazer com que os fatos se adequem à natureza (e pensar que Galilei, que disse que a Terra não era o centro do Universo, foi perdoado pelo papa há bem poucos anos).
Este ano, este aniversário, não deveria acontecer. Nosso planeta deveria ter sido varrido da existência muitas e muitas vezes; astrólogos e religiosos vêm fazendo profecias que falham, década após século após milênio, seguidamente. Tais declarações não têm fundamentação científica, como aquela dos Maias que preveem o fim do mundo pra daqui a 2 anos, logo não podem ser consideradas como teorias científicas. Uma das mais atuais declarações de que o mundo viria a acabar ganhou muita atenção ano passado, quando o novo colisor de partículas do CERN estava para ser ligado. Este colisor acelera prótons a altas velocidades e os colide uns contra outros, permitindo que físicos do mundo inteiro investiguem a estrutura da matéria. Diante do início dos experimentos, bradaram: “Este colisor provocará o fim do mundo!”
Bobagem. Colisões como aquelas que acontecerão, sob controle, dentro do detector ATLAS, do LHC, acontecem rotineiramente no universo e até mesmo em regiões próximas à Terra, sem maiores prejuízos pra espécie humana. A diferença está no controle, não na distância: se podemos realizar o experimento em ambiente controlado, temos a possibilidade de coletar informações de maneira também controlada. Grosseiramente, é como a diferença entre pegar um bife na geladeira ou sair pra caçar quando se quer comer. Coletar informações é chave para a aplicação do método científico: elas nos possibilitam criar novas teorias científicas a respeito de nossa existência ou, quem sabe, reforçar as teorias existentes (difícil, já que o modelo padrão que descreve o comportamento das partículas elementares já se mostrou insuficiente pra explicar os fatos conhecidos).
Entrei por uma perna de pinto e saí por uma perna de pato: do aniversário de uma das principais obras científicas já publicadas, passando pela necessidade de um método e ferramentas que validem ideias, podemos concluir que há, sim, algum método nas teorias que preveem o fim do mundo: passada a data, deixamos pra lá e a teoria apocalíptica torna-se bobagem. O LHC falhou em nos destruir ano passado, em seu período de testes. Acaba de ser religado, após mais de um ano passando por reparos e adequações, e já deixamos de lado a possibilidade de que os experimentos no colisor venham a trazer nosso fim. Graças.

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